sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

ACADEMIA SUL-BRASILEIRA DE LETRAS

CINZA

“Memento homo... pulvis es...” Lembra-te, homem,... és pó...

Tempo de cinzas. Tempo de pó. O carnaval já findou. Não há como segurá-lo. Esvaiu-se entre os dedos.

O corpo não agüentaria tanta ginga, tanto sonho. Somos fracos demais para o brinquedo total. A festa vem depois. “Apenas para sonhar, estamos um dia na terra” diziam os tlamatinimes astecas. “Para conquistar um coração forte como a árvore e a rocha, e um rosto compreensivo”. É o tempo da metánoia, da conversão, diziam os semitas.

- Converter os olhos, as mãos, o coração de onde e para onde?

- Para o rosto do outro que, ansioso, o aguarda, bem em sua frente.

Tempo de sair de si... Tempo para recuperar a si mesmo... desde a dis-persão, a dis-tração... Tempo de limpar o ouvido para ouvir a voz, o clamor do outro. Tempo de aguçar o olhar para poder ver o sorriso e a lágrima do outro. Tempo de aguçar o estômago para perceber a fome do outro. Tempo para descobrir a cabeça e a pele para perceber o vento, a água e o sol que nasce e sopram para todos. Tempo de con-versão. Não apenas tempo de re-versão.

A dispersão solipsista, individualista, egolátrica é tão grande, que o homem, sozinho, rodeando ao redor de si mesmo como cachorrinho atrás de sua cola, perdeu o horizonte. E o horizonte é aquilo a partir do qual nós localizamos tudo. O que está perto. O que está longe. O que está acima. O que está abaixo. Sem o horizonte a visão não vê, o tato não sente, o ouvido não ouve. Sem o horizonte não há caminho, nem caminhar. Não há passo. Não há dança. Não há descanso possível. Nem alegria. Nem a felicidade de ter chegado. E quanto mais largo o horizonte, maior o caminho e a possibilidade de ser.

O horizonte nem sempre é lógico, luminoso, unívoco. Mas é sempre convite, convocação para ser. O horizonte, porque transcende a tudo, tudo aproxima, tudo identifica e diferencia.

Pois este horizonte não é fabricação nossa. Não é fruto de nossas mãos. Ele se nos dá como possibilidade de sermos nós mesmos, diante do outro, face-a-face com o outro. Ele nos dá a possibilidade de reconhecimento de nossa pequenez, insuficiência, de nossa necessidade, de que somos peregrinos, pó.

Afundados que estamos no poço escuro de nossos devaneios, confundindo tropelias com caminhadas, solidariedade com esperteza, exploração do trabalho alheio com progresso, riqueza e produção nem sempre divisamos a porta do poço e uma nesga sequer de horizonte que nos permita ver flores pássaros e borboletas, estrelas e arrebóis, na bela parábola de “As rãs e o poço” de Rubem Alves. E nem percebemos o nosso charco, que passa a ser o melhor mundo em que vivemos, nem a estreiteza insalubre do poço, nosso pó. As “leis” de nosso ponço passam a ser o critério do certo e errado. A falcatrua, o mensalão, a propina, o engodo, a impunidade, a fraude passam a ser “normais”. O poço será o critério da “relatividade” de todas as coisas.

Sim, é preciso experimentar um pouco de cinza sobre nossa cabeça, sobre nossa fronte, para que saibamos da profundidade de nosso poço.

As cinzas, porém, não valem por si mesmas. O pó não vale pelo pó que é. Nem o jejum, a “penitência”, a dor têm sentido em si mesmas. A “quaresma” enquanto fecunda preparação para a Páscoa da Ressurreição não consiste apenas em abstinências e jejuns, em sacrifícios, como auto-salvação proposta pelos exploradores da dor alheia na Civilização Ocidental, tornando assim inútil a Ressurreição. Cristo nos salvou porque sofreu, dizem eles, e não porque ressuscitou. A dor, o sacrifício salvam... Isto, quem ensinou não foi o Cristianismo, foi o Estado de Cristandade e que a fez ideologia do mundo ocidental. O sadismo e o masoquismo deixaram de ser doentios. Passaram a ser o “destino” de todo o homem na terra.

A experiência do pó, da cinza, medida no horizonte da Ressurreição e da Vida, faz-se antecipação da Ressurreição. A espera não se faz mera expectativa. Faz-se esperança. Saída efetiva do poço. Encontro efetivo com os outros no fundamento do amor, da justiça, da verdade, e, assim, da fraternidade. O amor é o horizonte. E “o nome de Deus é Amor”.

A Academia Sul-Brasileira de Letras, independentemente deste ou daquele rito, convida você a olhar para a boca do poço e a experimentar o barro do fundo como suporte para sair para fora e a dançar sob a luz das estrelas. Atrelemos nosso arado a uma estrela para que a terra possa produzir pão e festa de solidariedade.

Jandir João Zanotelli.

quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

A UNIDADE PLURAL

Santa Teresa do Uruguai. O parque da Fortaleza se recupera aos poucos dos últimos incêndios. A arborização, a limpeza e a organização voltaram a se impor. O projeto paisagístico original de múltiplos verdes e flores. O sombráculo e invernáculo para flores de todo o ano. A Capatazia com suas imponentes palmeiras, já longe da ditadura, é bonito lugar para sentar, tirar uma foto. O mini-zoológico da Pajarera encanta as crianças. E o mar fresco, limpo das praias da Moza, Del Barco, das Achiras...um convite à saúde, à desopilação, ao descanso. E o Chorro, onde nossos filhos aprenderam, um a um, os primeiros passos da natação.... O braseiro de chão, que à noite fazia concorrência à lua que, por entre as altas árvores, se intrometia em nossas conversas, canções, enquanto degustávamos um peixe-rei recém retirado da água com nossos jererês, agora dorme sob as cinzas, como as crianças dormem nas barracas... Um chimarrão sorvido com a brisa fresca da manhã e a imaginação se solta reatando memórias de tantos acampamentos, de tantos laços familiares rejuvenescidos, de tantas amizades nascidas e crescidas ali. E uma certeza, uma vontade de cantar:

Sapete perchè, Il mondo và?... perchè in torno al mondo, gira l´amore...

Éh, o universo, desde sua mais primigênia raiz, até seu destino final é gerado, gestado, guiado pelo amor.

O amor do avô pelo netinho. Da mãe pelo filho... O amor das crianças, dos jovens, dos adultos. Amor que é busca e que é saudade. Que é aceno, que é afeto, que é confronto... Amor que é timidez, coragem, arrojo... Que é clamor, súplica, pedido por um pouco de atenção... Amor que é revolta, desespero, briga por um pouco de pão e um abraço de paz... Amor que é trabalho, suor e lágrima pelo pão de cada dia, pelo salário e pelo emprego...

Amor que se perde nas tortuosidades dos meios confundidos com fins... Amor que busca ser ouvido, e por isso grita, gesticula, se levanta mesmo pensando que vale subir nas costas dos outros...

Amor que recusa injustiça e procura-a para cada irmão.

Amor que se faz cochicho, afago, segredo, intimidade, delírio de encontros que prenunciam o céu.

Amor que se faz orquestra de pássaros convidando o parceiro para o filhote que precisa nascer. Amor que poliniza e fecunda, e se faz fruto, fartura do viver.

Amor que passa solitário, cabisbaixo, anônimo pelas calçadas...

Amor que se faz ordenamento econômico, político, social, cultural, ritmo necessário do conviver... paciência, pacificação, fraternura e vigor. Amor que se faz direito, dever... e respeito.

Amor que se faz prece ao Pai Nosso que tudo cria, que tudo envia, tudo convoca para o amplexo total...

Amor que, na impossibilidade, se faz inveja, gula, luxúria, orgulho, violência...como um grito desesperado para ser.

Porque o mundo, a vida, os homens, os anjos foram feitos pelo Amor e para o Amor...

O amor é constitutivo, essência, substância do que somos... do que não somos... e do que precisamos ser. Ele é a unidade dialética que vem antes e depois da discórdia, que constitui a alteridade de cada um, na Unidade plural...

Ah a timidez... o medo de não conseguir amar e ser amado..

Ah a pressa, a impaciência, de agarrar o amor, de fazê-lo seu, coisa reduzida ao alcance da mão... E então o amor foge, se esvai pelos dedos, se vela, se esconde... quem sabe aonde... e fica só a amargura e o vazio.

Ah o amor que se faz verdade, justiça, liberdade, gratidão gratuita e perdão...O amor que se faz história...

E o estribilho daquela música retorna ao ouvido:

Sapete perchè, Il mondo và?...

As crianças, abrem uma frestinha na porta da barraca, olham preguiçosamente e dizem: bom dia vô, vamos para a praia...

A Academia Sul-Brasileira de Letras deseja a você a harmonização que nasce e acontece a cada dia de 2012.

sábado, 9 de abril de 2011

Nova Página da Academia Sul Brasileira de Letras

A Academia Sul Brasileira de Letras, neste mundo globalizado, começa a disponibilizar seus trabalhos e informações nesta página.
Aqui você encontrará textos, contos, poesias e links para o Download de nossa revista, além, é claro de arquivos sobre os membros e um poco mais de informações sobre a ASBL.
Bem Vindo (a) e boa leitura!